
O Papa foi digital: como Francisco conectou fé, redes sociais e o futuro da Igreja
Com a morte do Papa Francisco em 21 de abril de 2025, o mundo perde uma figura espiritual singular — e talvez o pontífice mais conectado da história moderna. Muito além de suas posições progressistas e postura humilde, Francisco deixa um legado digital que transformou não apenas a forma como o Vaticano se comunica, mas a maneira como a fé é vivida e compartilhada na era da informação.
O surgimento digital de um Papa improvável
Quando Jorge Mario Bergoglio foi eleito Papa, em 2013, o cenário digital já era dominante: redes sociais cresciam exponencialmente, smartphones estavam nas mãos de bilhões e o mundo passava por uma mudança de comportamento jamais vista. A Igreja Católica, conhecida por sua estrutura conservadora e linguagem institucional, parecia distante desse novo universo.
Mas Francisco, com sua simplicidade e humanidade, compreendeu rapidamente o poder das redes — não como um canal de autopromoção, mas como um novo campo de evangelização.
Poucos meses após assumir, herdou a conta do Twitter @Pontifex, criada por Bento XVI. Mas foi com Francisco que o perfil ganhou vida: as postagens, em tom acolhedor e direto, alcançaram milhões. Suas mensagens de esperança, compaixão e crítica social ganharam curtidas, retuítes e corações no mundo todo.
O Papa do Instagram, do YouTube e das transmissões globais
Além do Twitter, o Papa também chegou ao Instagram (@franciscus), onde fotos e vídeos registravam sua rotina, encontros e momentos simbólicos. Através das redes, o mundo viu sua visita a presídios, seus abraços em refugiados e até selfies com jovens peregrinos.
As transmissões ao vivo do Vaticano também se tornaram populares — especialmente durante a pandemia de Covid-19. O icônico momento de Francisco, sozinho sob a chuva na Praça São Pedro, rezando pelo mundo, foi um dos eventos religiosos mais assistidos da internet.
Em 2021, o Vaticano lançou até um podcast oficial, com mensagens semanais e reflexões do Papa — e encorajou dioceses do mundo todo a se digitalizarem.
Polêmicas e repercussões digitais
Nem tudo foram flores. A presença do Papa nas redes também gerou debates:
- Em 2020, uma curtida de um suposto perfil oficial no Instagram em uma foto de uma modelo brasileira causou furor online — o Vaticano alegou invasão de segurança, mas o caso viralizou globalmente.
- Em vários momentos, suas críticas ao consumismo, ao negacionismo climático e ao armamentismo dividiram opiniões, especialmente entre grupos conservadores.
- A encíclica Laudato Si’, que aborda o cuidado com o planeta, teve ampla repercussão online e foi adotada como bandeira por ativistas ambientais digitais.
Ainda assim, Francisco usou a tecnologia para fomentar o diálogo e a escuta — realizando encontros com youtubers, influenciadores e jovens programadores. Foi o primeiro Papa a mencionar inteligência artificial em um documento oficial, alertando para os riscos da desumanização digital.
A Igreja antes e depois da transformação digital
A chegada do digital impactou diretamente a estrutura da Igreja. Antes restrita a documentos impressos, missas presenciais e jornais paroquiais, a comunicação religiosa passou a utilizar:
- Aplicativos com leitura diária do Evangelho
- Confissões online (com mediação pastoral) em tempos de emergência
- Cursos de formação à distância para seminaristas e catequistas
- Presença ativa de padres, freiras e teólogos em podcasts, TikTok e Twitter
Francisco abriu portas para uma nova geração de fiéis, mais conectada, mas não menos espiritual. A tecnologia deixou de ser vista como ameaça e passou a ser aliada da missão.
O legado digital: não é sobre likes, é sobre alcance
O Papa Francisco não foi um influenciador no sentido moderno da palavra. Mas influenciou milhões com sua coerência, presença e abertura ao diálogo — tudo amplificado pelas plataformas digitais.
Ele entendeu que para alcançar as periferias existenciais, era preciso também alcançar as periferias digitais. Onde há pessoas, há missão. Onde há tela, pode haver fé.
Com sua morte, fica o desafio para o próximo pontífice: manter essa conexão viva, humana e próxima, sem perder a profundidade que a fé exige.